Fazemos acontecer

Guerreiros do XVzão

Publicado na Revista Tutti Vida & Estilo | 06ª Edição | Março | 2013
Foto: Fábio Mendes

Ex-jogadores relembram grandes lances que marcaram a história do alvinegro

Eles sofreram, correram e suaram a camisa para o time que todos, não importa o número de outras equipes que defenderam, consideram o favorito. É o mistério do XV de Piracicaba, da camisa zebrada e da torcida apaixonada. Pelo alvinegro, Russo fez o que muita gente considera até hoje uma lenda: bateu escanteio e foi à área fazer o gol de cabeça; o centroavante Cardeal dava ‘dribles da vaca’ de desmoralizar adversário, e o lateral direito Nenê chegou a dar um chapéu em ninguém menos que Pelé.

Pelo chamado ‘gol incrível’, Russo, ou o advogado José Maria Cervi, fluminense de Barra Mansa, hoje residente em São Paulo, ficou famoso. Há vídeos sobre o fato (não há imagens do gol, que aconteceu em 1949, antes da chegada da TV ao Brasil) e recentemente ele foi tema de uma matéria do Esporte Espetacular, da Rede Globo.

“O (jornalista) Pedro Bassan veio a Piracicaba e me chamou para explicar o fato, numa simulação no Barão de Serra Negra”, conta. É que o lance aconteceu no antigo estádio Roberto Gomes Pedrosa, que ficava na rua Regente Feijó. “O Arnaldo César Coelho não acreditou na história e me deu cartão vermelho. Mas eu não acho que ele entenda muito”, dispara.

Tudo aconteceu na tarde de 28 de agosto de 1949 e o jogo do alvinegro piracicabano contra o Santos já estava em 2 a 1, com vantagem para os santistas. Eram 41 minutos do segundo tempo. O novato no XV, Russo (ele jogou de 1949 a 1951), foi bater um escanteio. Era uma tarde nublada, como lembra Russo. Ele chutou bem alto, e como a bola daquele tempo era de capotão, permitiu que desse tempo de ele chegar à pequena área e cabecear contra as redes adversárias. E o juiz, um inglês chamado Percy Snap, validou. Por isso é chamado por alguns de ‘gol para inglês ver’. “Mas não bateu em ninguém e o juiz validou. Está lá na súmula”, defende Russo.


Grande centroavante

Aos 92 anos, Cardeal, ou Antonio dos Santos, é outro grande nome do passado. O centroavante teve atuação destacada na subida do XV à primeira divisão em 1948, o que trouxe euforia à cidade. “Eu tenho uma longa história com o XV, que começou nos meus sete anos de idade, quando morava na rua Alferes (José Caetano), perto do Estádio. Tinha dois irmãos que também eram loucos pelo time. Mas quem entrou para o time fui eu”, conta Cardeal.

Ele jogou desde os 12 anos no infantil, e logo passou para o time principal. Era o típico ‘centroavante oportunista’, que sempre ficava livre para completar a jogada. “Meu gol mais bonito eu não sei dizer, acho que eram aqueles gols que o time precisava para resolver a partida”, explica. Cardeal tem uma definição muito simples para o XV: “O time mora em meu coração”. Acabou parando com o esporte depois de uma partida contra o Taubaté em que deu um ‘drible da vaca’ no zagueiro adversário. “A sola da chuteira dele ficou no meu joelho, o que me causou problemas”, conta. Logo parou a carreira, que nunca foi profissional. Aposentou-se após 36 anos de trabalho, 12 na extinta Fábrica de Tecidos Boyes e o restante no Departamento de Zootecnia da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz).

Cardeal: o típico centroavante oportunista

 

Goleiros de primeira

Hélio Fernando Sacconi, 68, foi goleiro do XV entre 1961 e 1968. “Era uma época em que o time estava bem e conseguiu voltar à primeira divisão em 1967, depois de um triangular com o Bragantino e o Paulista de Jundiaí”, conta o pai da jornalista Ellen Sacconi, da EPTV.

Ele já atuava como profissional naquele tempo, mas destaca que não era como hoje, em que alguns atletas ganham salários milionários. “A gente treinava coletivo de terça e quinta, e individual de quarta e sexta. A maioria vivia de futebol, mas alguns ainda tinham outras profissões”, lembra.  Da rivalidade, ele lembra que o pior momento aconteceu contra o Paulista de Jundiaí, na disputa pela volta à ‘Primeirona’. “A gente foi de ônibus, teve de trocar de roupa no Lago Azul e fomos até o estádio com a torcida adversária jogando rojão. Foi um filme de terror.”

Outro goleiro que marcou época, Orlando (Antonio Orlando da Costa), hoje com 76 anos, era o titular no tempo em que Hélio foi reserva na posição. Ele jogou de 1957 a 1965. “Depois fui para Bandeirantes, no norte do Paraná, mas eu guardo mesmo no coração a fase do XV, porque eu sou piracicabano, nascido na esquina das ruas Alferes com Monsenhor Rosa, bem perto do antigo estádio”, conta.

Orlando dividiu o futebol com a mecânica de automóveis, que passou a seguir depois de terminada sua fase nos gramados. “O XV vai morar sempre no coração da gente. Eu tenho de ser sempre quinzista.”

Hélio Fernando Sacconi, 68, foi goleiro entre 1961 e 1968

 

"Chapéu" em Pelé

O lateral direito Nenê, 60, ou Dejandir Muller, viveu o maior momento do XV, quando o time foi vice-campeão paulista em 1976. Da carreira do time, que durou de 1969 a 1980, ele lembra também que chegou a dar um ‘chapéu’ em Pelé, que já era mito no Santos. “Ele até brincou comigo. Perguntou o que eu tinha contra ele”, lembra.

E conta os altos e baixos de se trabalhar com Romeu Ítalo Rípoli, o presidente do XV na época. “Na véspera da disputa pelo campeonato, ele foi numa mesa-redonda e começou a falar mal de todos os jogadores do Palmeiras. Os caras chegaram tão ‘mordidos’ que, no primeiro gol, entraram uns oito para pegar a bola de volta”, lembra.

 

Mas essa rivalidade eram ossos do ofício. Nenê lembra o prazer de conviver com nomes como Gerson, Ademir da Guia, Tostão, Clodoaldo e Carlos Alberto, o capitão do Tri. “Esse foi meu mestre, meu espelho como lateral direito.”

José Eduardo Pianelli, 49, o Du Pianelli, também conviveu com outras feras e teve uma passagem marcante pelo São Paulo. Ele começou com o futebol em 1981, na escolinha do XV, e passou para o pro fissional dois anos depois. “Comecei em 1983, quando o time voltou à categoria principal. Mas no ano seguinte fui para o São Paulo, onde fiquei até 1986”, conta. Era uma fase em que atuou ao lado de Oscar, Dario Pereira, Muller, Silas, Pita e Careca.

O lateral direito Nenê (Dejandir) conseguiu dar um ‘chapéu’ no próprio PeléDepois, Pianelli foi para o América de Rio Preto, o Juventus e o Rio Branco de Americana. “Mas o XV foi o time que mais me marcou, porque tenho esse carinho. Foi o time que me projetou, a quem devo tudo. Só de lembrar, passa um filme na cabeça da gente”, conta. Ele acabou interrompendo a carreira de futebolista aos 35 anos, passou a dar aulas em uma escolinha de futebol e hoje trabalha numa fábrica de móveis.

Marcos Antonio Pizelli, hoje com 55 anos, era o famoso goleiro quinzista dos anos 80. “Eu comecei em 1975, aos 18 anos, quando fomos campeões do Torneio José Ermírio de Moraes, que hoje é a Copa São Paulo”. No ano seguinte foi vice-campeão paulista. “Trabalhar com o (Romeu Ítalo) Rípoli era bom, ele foi um grande presidente, mas você sabia que ele nunca seria uma pessoa comum”, explica. Em 1983, foi novamente campeão da segunda divisão.

O ex-goleiro, que hoje é preparador de atletas para a posição, e faz um trabalho de base na Unimep (Universidade Metodista de Piracicaba), conta que os jogadores sempre tiveram de ter paciência com a arbitragem. “Era comum isso acontecer. O Dulcídio Vanderlei Boschilia, mais famoso juiz da época, sempre dizia: ‘Estão preparados para empatar no máximo? Porque ganhar vocês não vão!’ Uma vez eu disse: ‘Dulcídio, você está assumindo que vai roubar?’ Ele não se abalou: ‘Que é isso? Só estou falando que vocês não vão ganhar. É diferente!’” (por Ronaldo Victoria)

 

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