O artista plástico piracicabano Marcelo Gimenes, 45, já saiu do Brasil há mais de 20 anos, construindo uma carreira de sucesso na Holanda. Mas o Brasil, claro, não sai da vida dele. Especialmente um pedaço querido, a casa onde fica dois meses por ano em Piracicaba, no Jupiá, alto da pedreira do Bongue, de onde se tem uma das vistas mais deslumbrantes do rio Piracicaba.
Marcelo acredita nas imagens que acalmam a mente, no poder da beleza em tempos difíceis, no ‘tempo da delicadeza’, como já disse o mestre Chico Buarque. “Se eu fosse definir em poucas palavras o meu trabalho atual, diria que quero sempre resgatar o romantismo”, conta.
É isso que ele vem fazendo agora em Rotterdan, na Holanda, onde criou uma empresa, a Snidjer and Co, com o parceiro holandês Jaap Snijder. “A nossa ideia é resgatar o trabalho artesanal, que vem se perdendo. O que acontece hoje em dia é que o luxo de um trabalho exclusivo acaba ficando muito caro, tanto que, atualmente, as grandes grifes de alta costura acabam faturando bem mais com óculos e perfume”, analisa Gimenes.
Ele desenvolve, junto com o sócio, tecidos, papéis de parede e desenhos em pratos, tudo feito à mão, e com estampas exclusivas. “A minha parceria com Jaap funciona perfeitamente porque ele é mais ligado à parte gráfica, e eu ao design. As ilustrações em papel de parede, feitas em losangos simétricos, apresentam estampas de insetos como libélulas, mosquitos ou besouros”, conta, referindo-se à coleção Entomology, que está fazendo o maior sucesso em terras holandesas.
O artista conta que até se diverte com a reação das pessoas em relação à escolha de insetos. Muitos demoram a se acostumar e não veem romantismo ao primeiro olhar. “Escolho porque é um mundo que não se desenvolveu ainda, é algo pouco explorado. E o engraçado é que as pessoas não percebem ao ver de longe, só descobrem que se trata de insetos ao chegar bem perto”, conta.
Ele também aplica imagens de pequenos insetos em pratos de segunda mão e afirma que o resultado tem sido muito bom. “A aceitação vem sendo positiva. A Europa enfrenta uma crise enorme e boa parte das empresas está fechando. Creio que isso aconteça por falta de arrojo, porque os artistas estão preferindo ser acomodados”, declara.
Acomodação que nunca fez parte de seu dicionário desde que decidiu sair do Brasil, ainda no final dos anos 80. “Na verdade, eu nunca saí daqui. Emocionalmente ainda estou bastante ligado. Só me ausentei fisicamente”, revela. O trabalho dele mostra essa influência brasileira de várias formas, até no crochê que ele cresceu vendo a tia-avó fazer.
O desejo de enfrentar novas realidades veio quando havia acabado de completar o ensino médio e trabalhava como arte-finalista no extinto jornal piracicabano O Diário. “Fui com a cara e a coragem mesmo”, admite.
A primeira parada foi em Lisboa, cidade que achou maravilhosa. Mas, em 1987, teve de voltar correndo por conta de uma tragédia. Cinco pessoas de sua família morreram num acidente automobilístico na avenida Doutor Paulo de Moraes. “Eu voltei três dias depois do enterro. Fiquei dois meses, mas fui embora de novo. Se ficasse, naquele momento, tudo ia me lembrar o acidente”, conta.
A volta foi bem mais produtiva. Trabalhou na Benetton e numa empresa que importava plantas desidratadas. Daí conheceu um grupo de holandeses que trabalha com pesquisa em artes plásticas. Em seguida, se estabeleceu em Rotterdan, com sua própria empresa, que o fez prestar serviços até na Casa Real, em Haia.
Fiquei cinco anos sem vir para o Brasil, trabalhando num centro de decoração e design. “Foi uma época extremamente produtiva e de responsabilidade. Eu ditava a moda no setor. Trabalhava 18 horas por dia, sete dias por semana”, lembra. O resultado, além do enorme reconhecimento profissional, foi um infarto aos 35 anos de idade.
“Entendi isso como um recado, dei uma parada para reavaliar e agora tenho outro tipo de atuação”, revela. Um bom exemplo é a Barce Foundation, que faz um trabalho beneficente, usando gravuras. No ano passado, as gravuras com um beija-flor como motivo (lembrando a fábula do pássaro que leva uma gota de água por vez para apagar um incêndio) e teve renda revertida para a Avistar, entidade piracicabana dedicada aos deficientes visuais.
Analisando toda essa trajetória, Gimenes conta que já incorporou características europeias em sua personalidade. “Eu hoje sou bem mais pontual e chego sempre no horário combinado. E nos negócios vale o que está escrito”, explica. Ele tira o melhor da formalidade da Europa, mas a alma ainda conserva muito do jeito brasileiro. “Eu sinto saudade do céu azul no Inverno, do nosso verde, e adoro samba. Por isso sempre venho no começo do ano para pegar o Carnaval”.
E revela que hoje o país continua cada vez mais em alta nos meios europeus. “Não sei se as pessoas sabem o quanto somos valorizados lá fora. Somos realmente vistos como o país do futuro”, completa. (por Ronaldo Victoria)