Um dia para os porteiros
Publicado na Revista Tutti Vida & Estilo | 20ª Edição | Junho | 2015
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Foto: Guilherme Miranda
Por Ronaldo Victoria
Profissionais celebram o 9 de junho e falam das qualidades que a função exige
A primeira impressão é a que fica. Então, não dá para negar a importância dos porteiros para os condomínios. Da forma como eles recebem moradores ou visitantes depende a imagem do local. Porteiro tem que ter calma, paciência e jogo de cintura, eles admitem. E a categoria, que conta com mais de 400 mil trabalhadores em todo o Brasil, tem uma data especial: 9 de junho.
A data foi oficializada pela Federação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores de Edifícios e Condomínios, mas não se sabe o motivo específico da escolha do dia. Pela tradição,
o dia mais indicado seria 29 de junho, dedicado a São Pedro, considerado o Porteiro do Céu. Apesar de ser definida como nacional, a data no Estado do Rio de Janeiro é comemorada em 25 de junho.
Em Piracicaba, tem até porteiro com nome de gênio da física. É Heinstein (o H a mais é invenção do escrivão) Martins, de 52 anos, que trabalha há quatro anos no Edifício Albatroz, localizado no Centro. Ele conta que o nome, uma homenagem a Albert Einstein, foi ideia do pai, Triet. “Eu achava meu nome diferente, mas ninguém me explicava quem era Albert Einstein. Só fui descobrir na escola e achei legal. Mas meus colegas tiravam um pouco de sarro porque diziam que eu era o inventor da bomba atômica. Criança é sempre assim, não perdoa nada”, lembra.
Heinstein morava na pequena cidade de Bom Sucesso, no interior do Paraná, e é o único filho homem. Embora as quatro irmãs não tenham nome de personalidade, ele conta que o pai sempre foi criativo na hora do batismo. “As minhas irmãs se chamam Marinel, Clorinei e Cibele. O nome mais comum é Rosemeire, que foi minha mãe que escolheu”, diz.
Ele deixou o Paraná ainda na juventude porque as oportunidades de emprego eram reduzidas. Está desde 1976 em Piracicaba e trabalhou por 22 anos como motorista particular da família Paes de Barros, proprietária das indústrias Morlet. É casado há 22 anos e tem duas filhas: Helen e Vivian.
Ele conta que foi um desafio começar uma nova profissão aos 48 anos depois de tanto tempo como motorista. A cartilha do bom porteiro, segundo Heinstein, tem cinco pontos principais e não admite relatividade. Têm de ser cumpridos. “Primeiro, ele tem de ser atencioso. Tudo o que o morador pede, ele tem de estar pronto a atender. Em segundo lugar, ele precisa ser comunicativo. Porteiro carrancudo e que não abre a boca não dá, os moradores logo pegam implicância”, ensina.
O terceiro ponto é polêmico e está ligado ao anterior. Porteiro tem de falar, mas na medida certa. “Tem de ser discreto. Precisa falar somente o necessário. Se você fica falando demais, pega mal. Já chega que a gente tem fama de fofoqueiro”, ressalta. As qualidades seguintes são a paciência e a solidariedade. “Você tem de ser paciente, não pode perder a razão, às vezes o condômino chega estressado e não se pode nunca bater boca.
O maior problema é com vaga na garagem. E tem de ser solidário, não pode fazer só o arroz com feijão. Ajude uma senhora com as compras, não custa nada”, aconselha. Síndico do Albatroz, Gilson Roberto do Amaral destaca que cabe a ele a escolha dos porteiros. “Escolher é algo de muita responsabilidade. Você tem de levar em conta em primeiro lugar a questão da segurança. Tem, sim, de ver os antecedentes criminais dos candidatos, pois é um cargo fundamental, não dá para colocar gente errada no lugar.
Pela minha experiência, eu gosto daqueles comunicativos e que ficam no meio termo. Não gosto nem dos que falam demais, nem dos que não abrem a boca”, explica.
RESISTÊNCIA
Maria Aparecida Oliva, também de 52 anos e nascida no Paraná, está no cargo de porteira do Edifício Alferes o mesmo tempo: quatro anos. A história dela mostra uma lição de resistência. Cida era faxineira do prédio, mas começou a sentir dores fortes na coluna. Em algumas horas do dia ela precisava ficar deitada por um tempo, no condomínio, para aguentar a jornada. Mas não desistiu.
A causa provável foram os longos anos em que Cida labutou na lavoura, como cortadora de cana, e de outras lavouras, tanto no Paraná, quanto em Piracicaba, para onde veio há quase 40 anos, ainda criança. Cida começou bem cedo o trabalho. “Lá a gente trabalhava em roça de café, milho, feijão e arroz. Aqui eu cortei muita cana nas usinas Costa Pinto e Santa Helena. É um trabalho pesado, as mãos da gente doem, o corpo inteiro dói. E comer aquela comida gelada da marmita é duro! Mas vai indo, vai indo, a gente se acostuma”, lembra.
Depois da fase de cortadora, começou como faxineira e depois veio a portaria. Cida conta que gosta muito da sua nova função, se sente valorizada. “O pessoal do prédio me conhece porque estou aqui há muito tempo. Estou bem melhor assim. Mudou a minha vida.”
Nelson Antonio Zanata, síndico do Alferes, conta que é difícil escolher uma pessoa desconhecida para o cargo. Por isso, revela que a escolha de Cida foi para ele motivo de orgulho. “Eu dei uma chance para uma pessoa que todo mundo no prédio já conhecia e o resultado foi ótimo”, conta. Pela receita de Zanata, a discrição é item essencial para os porteiros. Eu não admito que ele seja indiscreto e fique contando detalhes das vidas dos moradores. Outra coisa é a gentileza. O nosso condomínio tem muitas pessoas de Terceira Idade. Acho estranho um porteiro não ter a atitude de ajudar uma senhora. Isso conta ponto”, destaca.
Segredos da boa contratação
O porteiro de qualquer condomínio transita entre dois universos: os moradores e o público externo. Este profissional é a primeira via de contato do condomínio, autorizando ou não a entrada de visitas, prestadores de serviços ou dos funcionários das unidades.
É ele também o primeiro a zelar pela segurança e por manter um clima cordial, respeitoso e profissional na portaria. Ele não deve temer barrar possíveis visitantes, afinal, liberar ou não pessoas depende apenas dos moradores – o porteiro executa as ordens que lhe foram dadas. Mas como contratar um profissional tão plural? Confira as dicas do Secovi-SP (Sindicato da Habitação de São Paulo).
1) A administradora deve realizar entrevista pessoal com o candidato, de preferência por profissional com conhecimento em processos seletivos e práticas de recursos humanos;
2) Exigir que o candidato preencha, de próprio punho e com letra legível, ficha com dados pessoais (nome completo, CPF, RG e endereço). Para evitar problemas com homônimos, esta ficha cadastral tem de conter também informações como nome do pai, da mãe, data, ano e cidade onde nasceu;
3) Se possível, a administradora de condomínios deve providenciar análise grafológica das fichas, realizada por profissional capacitado;
4) Solicitar atestado de antecedentes criminais;
5) Certidão negativa de cartório de protestos;
6) Certidão negativa do distribuidor forense (Justiça criminal);
7) Certidão negativa da Justiça do Trabalho;
8) A administradora de condomínios deve analisar, ainda, se o aspecto pessoal do candidato é compatível com a função para a qual ele se candidata;
9) Buscar referências nos dois últimos empregos do candidato. Falar diretamente com o síndico, para obter informações sobre temperamento e sociabilidade, bem como capacidade e conhecimento técnicos;
10) O período de experiência deve obedecer 45 dias de trabalho, prorrogável por mais 45 dias;
11) Os síndicos devem pagar aos funcionários dos condomínios salários compatíveis com os praticados no mercado. Assim, evita-se a dupla jornada de trabalho;
12) Promova a reciclagem profissional a cada seis meses, para manter o funcionário atualizado e fazer a revisão dos procedimentos. Colaborou Cristiane Bonin
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