Tutti Condomínios - O que representa a Fundação Dedini para a senhora, que preside a entidade?
Márcia Dedini - É um sonho dos acionistas, acho que está no DNA da família, em toda a história do Seu Mario (Dedini) e da benemerência dele. Em qualquer cantinho de Piracicaba você tem a marca da Dedini. Quando as mulheres acionistas começaram a trabalhar na empresa, o que começou com a Juliana (Dedini Ometto), vimos que seria bom a gente assumir essa área de responsabilidade social, essa área forte na Dedini.
A senhora diria que responsabilidade social é uma área mais feminina?
Pela sensibilidade, pelo detalhismo, e a mulher é mais detalhista, acho que ela tem uma visão um pouco melhor que a masculina. O homem é mais pragmático, mais direto. Tanto que quando assumimos a área de responsabilidade social, nós não buscamos nada novo, nada inovador.
Não quis inventar a roda...
Isso. O que nós procuramos fazer? Nós procuramos pesquisar, ver a demanda, qual era a necessidade de Piracicaba e região. Nós visitamos vários hospitais, várias escolas, fomos a creches, postos de saúde.
E quando assumimos, a Dedini não tinha um regimento interno que norteasse as doações. Então, nós buscamos com a nossa gerente de serviço social, Elizabeth Simões, todo direcionamento, toda retaguarda, para fazer com que nossas ações tivessem uma ação institucionalizada.
Foi fácil criar a fundação?
Não. Foi uma luta de um ano.
Não disseram que a senhora estava sendo muito romântica?
Eu, a Juliana e a Adriana (Dedini Ricciardi) éramos chamadas de ‘mulheres de ferro’. E o Malo (Mário Dresselt Dedini) brincava dizendo que nós éramos as ‘Magnólias de Aço’. Porque a gente levou muito a sério, muito ao pé da letra essa institucionalização das nossas ações. E foi interessante que a partir daí toda política de doação das empresas passou a constar do planejamento anual.
A mulher, quando quer fazer alguma coisa, tem que ser de ferro?
Olha, muitas vezes sim. Muitas vezes.
E como ela tem de agir?
Em primeiro lugar, acreditar naquilo a que ela está se propondo. Em segundo lugar vem a transparência. É você prestar contas. Com isso, ganha uma credibilidade. Hoje sinto que somos muito respeitadas aqui pelos nossos colaboradores. São as pessoas que mais incentivam os nossos projetos. Eles estão envolvidos nas ações da fundação. Temos voluntários em todas as áreas: jurídica, contábil, comercial, todas.
Quantos anos tem a fundação?
Foi criada em 2006 e lançada em 2007, com um projeto maravilhoso, a construção da maior creche de Piracicaba, 2.000 metros quadrados, no bairro Santa Fé. É uma escola de Primeiro Mundo.
Atende quantas crianças?
É para 350 crianças. Além deste, temos vários outros projetos. Fizemos a revitalização da praça da Pinacoteca, para melhor acessibilidade. Temos ações de apoio em várias questões da criança e do adolescente, calendário ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), vídeo ECA. E esse vídeo, que marca os 18 anos do ECA, tem sido usado nas escolas, nos cinemas de rua, e quem tem utilizado bastante é a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social. Para a gente foi muito bom.
Que satisfação traz essa atuação?
Quando eu vejo a logomarca da fundação em qualquer lugar, fico muito emocionada. Acho muito gratificante. Quanto ao contato com as crianças da creche, eu não tenho palavras. Eu acredito que o ser humano é solidário por natureza, uns mais, outros menos.
Não acha que tem alguns que não são?
Acho que no íntimo isso não foi despertado. Ou foi uma falta de oportunidade. A gente podendo fazer um trabalho em que está pensando no outro, quem ganha é a gente.
Se a questão social ficar mais difícil, fica mais complicado para a classe média, não?
Se você for ver, é muito difícil ficar impassível a essa diferença social. Porque isso se reflete não só na educação, mas na saúde, na cultura. E aí é uma bola de neve, você perde espaço, qualidade de vida. E o medo se instala na gente. E você fica refém ... Acredito, sim, que toda pessoa não fica indiferente.
E Piracicaba? O que representa para a senhora essa cidade?
Nasci aqui, moramos só um ano fora, nos Estados Unidos. Isso quando o Malo foi estudar. Gosto muito daqui.
Qual o charme de Piracicaba?
É uma cidade muito bonita. O que está acontecendo agora, esse fenômeno da migração, me sinto também estrangeira. A cidade está mudando muito. E pela própria idade, a gente fica mais caseira mesmo.
Não sai mais à noite?
Malo e eu, até uns 15 anos, éramos muito festeiros. A gente saía até em Carnaval de rua, pela Zoon Zoon. Saímos quatro anos seguidos, de rei e rainha, de chineses, de charleston. Eu adorava.
Hoje por que não faz mais isso?
É uma tendência natural da idade se recolher. Tem uma época em que fica mais preso por causa dos filhos adolescentes. Tem de acompanhar, levar, buscar num lugar. Você não tem mais aquela elasticidade de horário ou disponibilidade.
São três filhas?
E duas netas. As filhas são Mariana, Marília e Marcela. Mas foi coincidência os nomes começarem com M também. Só a caçula que a gente procurou. As netas são Zara e Lina.
Avó é mãe com açúcar?
Eu não sou dessas avós que boicotam a educação do pai e da mãe. Eu sei o que é difícil. Nem sou de dar alguma coisa sem pedir pra minha filha. Estou contribuindo muito mais com a minha neta. E minha filha é uma mãe nota 1.000.
Hoje se diz que a mulher não tem tempo para os filhos. Mas é possível, não?
Ela deu uma parada na vida profissional para cuidar das filhas.
A senhora também deu essa parada?
Eu não tinha trabalhado antes. Sou bacharel em direito, formada pela primeira turma da Unimep. Quando minha caçula tinha uns sete anos, eu quis estagiar na área jurídica da Dedini. Mas fui proibida. Mulher acionista não trabalha. É uma empresa que, se você for ver, tem uma característica machista. Até pelos produtos dela.
Destilaria, moenda, caldeiraria, siderurgia...
Não me deixaram. Meu sogro (Armando Dedini) faleceu, em 1987, e o Malo é filho único. Ele me chama de Boneca. E me disse: “Boneca, preciso de você lá”. Comecei muito leve, de mansinho. Porque até então as mulheres não poderiam trabalhar. Fui tomando pé das coisas.
Na geração do Dovilio Ometto (ex-presidente da Dedini, já falecido), mulher não trabalhava.
Nem na do Seu Mario. Nenhuma. E quem foi a vanguarda foi a Juliana, filha do Dovílio. Ela foi uma mulher de fibra, tenho uma saudade grande dela. Ela era determinada, mas ao mesmo tempo boníssima. Daí fomos indo e aí nos anos 90 aumentou. Eu me senti privilegiada, porque minhas filhas já estavam moças. E mesmo assim, teve uma época em que elas reclamaram. E também por não ter essa dualidade de sentimentos, eu estou aqui, mas quero estar lá, estou lá, mas quero estar aqui. Me sinto abençoada.
Quanto tempo dura a união com Malo?
São 38 anos. É uma parceria mesmo. Hoje está difícil encontrar casamento que dure assim.
Quando pensa no futuro das suas netas, te dá preocupação?
Eu tenho. Se você for ver o retrato que a gente tem hoje, de mundo, de sociedade, de comportamento, eu me preocupo. No sentido de que hoje está tudo muito rápido, a coisa exterior é a que está tomando lugar do essencial.
Mas às vezes a senhora também não é vítima disso? Não falam, ah ela é rica, faz as coisas por diletantismo?
Nunca me falaram. Podem até pensar. De uma certa forma, sou privilegiada também, de poder fazer uma coisa para o próximo. Mas tenho a retaguarda de uma empresa. Tem pessoas que precisam ralar, têm de ir atrás, têm de lutar. Existe um grau de diferença aí. Dizem coisas sobre ser rica, não ter o que fazer, mas nunca mais ouvi.
Talvez porque os preconceituosos sejam hipócritas, não? Não falam pela frente...
Acho que não diriam na minha frente. Nesse ponto sou meio crédula. O meu feedback são as pessoas daqui. Vejo neles muito do respeito que eles têm, da participação deles com a fundação, com nosso Comitê de Responsabilidade Social.
Vem todos os dias à Dedini? E faz o que nas horas vagas?
Eu faço muitas coisas, pinto e bordo. Me perguntam: “Assiste a novela?” Eu respondo que escuto. Sempre estou fazendo alguma coisa. Televisão nem vejo tanto, ela fica lá ligada.
Assistiu Mulheres Ricas (reality show da TV Band)?
Vi os dois primeiros episódios. Não aguentei. Existem coisas que você não precisa falar abertamente. Principalmente quando você fala do outro. Às vezes, me pego tendo um sentimento não tão nobre, mas é uma coisa que eu guardo para mim. E tento perceber o porquê daquilo. Agora, você se expor dessa maneira, foi uma coisa muito chula. E num país de um contraste como o nosso... Falar coisas como “em Angra (dos Reis) pobre não pode ir”! Meu Deus do céu! É um acinte. (por Ronaldo Victoria)