Daniel Campos tem, aos 14 anos, uma vida bem ocupada. Além de estudar no 9º ano do ensino fundamental do CLQ (Colégio Luiz de Queiroz), participa do Projeto High School da unidade de ensino (já domina perfeitamente o inglês), que tem intercâmbio com uma escola do estado americano do Texas. Também tem aulas de desenho, entre outras atividades, além de ser o síndico-mirim do condomínio vertical onde mora há cinco anos, o Edifício San Marino, localizado na Cidade Alta.
Daniel foi eleito no ano passado por votação direta dos membros do conselho, ou seja, os adultos. Tem como assistente Carolina Brioschi, de 12 anos. Está certo que a nova atividade não toma tanto tempo assim dele. Afinal, as reuniões acontecem de três em três meses. Mas Daniel conta que tenta se dedicar ao cargo.
Isso inclui batalhar pelas reivindicações dos moradores de sua faixa etária, entre crianças e adolescentes. “É bom ser síndico, porque a gente pode arrumar um monte de coisa que está errada”, conta. A pauta das reuniões é transmitida para o síndico adulto, o professor Juan Sebastianes, que se encarrega de colocá-la em prática.
As propostas incluem questões que podem passar batidas para gente grande, mas fazem muita diferença para a criançada do prédio. Como exigir que todo bebedouro tenha uma parte rebaixada que permita beber água sem ter de pedir que um adulto o levante, por exemplo.
Daniel conta que o pai, Cláudio, apoia sua participação. “Ele sabe que é uma experiência diferente e que pode trazer mais responsabilidade para mim”, conta o garoto que ainda não pensou qual carreira seguir. Por enquanto está em dúvida entre ser advogado ou publicitário.
O síndico-mirim não gosta de ouvir que hoje a sua geração fica mais na internet e não se importa com leitura. “Não é bem assim. Eu leio jornal, revista, livro. Mas não acho que o pessoal se interessa muito por assuntos como ecologia e sustentabilidade. Eu tenho interesse, mas não a maioria”, explica. Quanto ao que mais o incomoda no país, ele não tem dúvida: “Corrupção”, dispara.
Assistente do síndico, Carolina também tem uma vida que classifica de ‘corrida’. Além das aulas do 7º ano no mesmo colégio do amigo, faz curso de inglês e tem um personal trainer que vai até o condomínio. Carolina diz ser ‘cria’ do condomínio, onde nasceu e até mora hoje. “Não sei como é viver em outros lugares, e gosto bastante de morar aqui. Eu ajudo o síndico com as ideias. A gente tem de pensar bastante para tornar o prédio um lugar também legal para as crianças”, lembra Carolina.
Sobre os pontos positivos, a sub-síndica destaca as várias instalações, pois o condomínio conta com parquinho, piscina, churrasqueira e quadras esportivas. “A gente pode fazer tudo por aqui mesmo. Nossos pais não precisam ser sócios de clube”, conta. A falta de privacidade é um dos poucos itens negativos. “Não tem jeito, tudo o que você faz o pessoal fica sabendo. E você não pode trazer os amigos para vir à piscina. Mas isso é o de menos, no final tem muito mais coisas positivas”.
O síndico-mirim Daniel Campos mostra que tem opinião formada sobre tudo?
O que o morador não pode fazer no condomínio: “Não pode fazer barulho à noite. Tem certas coisas que você precisa saber que não vai mais poder fazer. Não pode ficar chamando seus amigos para nadar na piscina do prédio.”
E pode fazer churrasco? “Claro, mas você precisa respeitar certas regras. Tem de deixar o porteiro avisado, marcar o horário de começo e de fim. É simples.”
O que acha de animais no condomínio? “Nada contra, desde que você tome conta. Aqui a gente pode ter, mas eu preferi não ter.”
O que o incomoda mais? “Sinceramente, não tenho me incomodado com nada.”
O que é uma pessoa mal educada? “Tem gente mal educada em todo lugar. Ainda vejo gente que joga lixo na rua, por exemplo, o que acho um absurdo. Tenho vontade de chamar a atenção, mas não falo nada. Pego o papel do chão e procuro um lixo.”
Mas qual é a maior prova de falta de educação? “Eu acho aquelas pessoas que julgam ser ‘bonito’ destratar quem elas julgam inferior. Como empregados, garçons, porteiros. Ainda bem que não vi isso no prédio.”
Já pensou em sair do prédio? “Não, mas meu pai está construindo uma casa num condomínio horizontal. Acho que terei mais liberdade”.
O que chateia no Brasil? “A política.”
A sua vida mudou depois de ser síndico-mirim? “Não, acho que ficou a mesma coisa. Mas está sendo bom discutir várias questões.”
Em prédio, tem muita gente que reclama demais? “Tem. E geralmente quem reclama muito, faz pouco.”
Você se preocupa com ecologia? “Bastante, e aqui no condomínio temos coleta seletiva há muito tempo. Recentemente instalamos um novo sistema para que se descartem as bitucas de cigarro com segurança.”
Os fumantes hoje são discriminados? “Eu não tenho nada contra quem fuma. Aqui no prédio nunca vi ninguém fumando em local fechado. Mas não vi nenhuma discriminação.”
Existe muita discriminação em geral? “Existe muita, contra os negros, os que têm sexualidade diferente, os gordos, os deficientes. As pessoas acham que melhorou, mas eu acho que está a mesma coisa.”
E bullying? “Sempre teve, mesmo antes de ser caracterizado com essa palavra. Nunca tive de enfrentar.”
O que é mais legal no Brasil? “A gente tem orgulho do nosso futebol e da nossa música. A nossa arte.”
E o que dá vergonha? “Essa roubalheira toda de que a gente ouve falar. Quando eu penso nisso, me sinto mal.” (por Ronaldo Victoria)