Guilherme Grisotto Bigaran, 10, fica firme no lombo da égua Bibi e aguarda o começo de mais uma aula. Ele vai todas as quintas-feiras de manhã na Equoterapia da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz). Nada demais se Guilherme não tivesse nascido com uma grave doença, chamada Sequência de Pierre Rubin, que afeta o sistema respiratório.
“Quando ele nasceu, os médicos me disseram que ele não sentaria e me prepararam para o fato de que ele não viveria muito”, conta a mãe, a dona de casa Renata Grisotto Bigaran, que acompanha as aulas. Se aqueles médicos o vissem hoje, certamente se surpreenderiam. Guilherme retirou o aparelho da traqueostomia em agosto do ano passado, fica firme ao se sentar, dá os primeiros passos apoiado num andador e acabou de ganhar uma bicicleta.
Boa parte do progresso Renata credita às aulas de equoterapia. “Essas aulas foram as melhores coisas que puderam acontecer para ele. Ele melhorou em tudo, não só na postura, mas no ânimo”, diz a mãe. Para a fonoaudióloga Renata Luccas, que acompanha o tratamento, não é exagero achar que Guilherme possa vir a falar. “Ele tem a possibilidade disso, porque nesses dois anos a linguagem não-verbal dele está melhorando. O que o cavalo dá para ele é a criação do vínculo, e com isso ele aumenta também a interação social”, conta. Guilherme é também apoiado pelo guia Denilson Chiquito e pelos fisioterapeutas Laerte Ferrari e Débora Rocha. A primeira companheira, a égua Shirlinha, com quem ele interagiu de agosto de 2009 a dezembro de 2010, está doente. Mas o menino faz questão de oferecer cenouras todas as semanas para a amiga.
Coordenador da equoterapia, Cláudio Haddad conta que o serviço é oferecido desde 2001, tempo em que foram realizados mais de 8.000 atendimentos. “A equoterapia é um processo antigo. Desde o tempo dos gregos antigos, usava-se o cavalo para a recuperação dos guerreiros”, conta. Desde a segunda metade do século passado, lembra Haddad, a terapia vem sendo usada em duas vertentes: a de saúde, para pessoas com deficiência; e a educacional, que visa a pessoas com algum distúrbio mental leve, como os hiperativos.
Segundo Haddad, os movimentos do cavalo em sua marcha permitem ao paciente uma estabilização do movimento rotacional, ligado à cintura, e facilitam a postura. Hoje a clínica conta com 76 pacientes, que são atendidos com aulas semanais de uma hora. “Entramos na parte de prestação de serviços à comunidade feita pela escola e hoje temos lista de espera para atendimento”, revela. Interessados podem obter mais informações pelo telefone 3429-4102.
O melhor amigo da estudante Ana Teresa Lacorte, 19, é hiperativo e tem jeito de moleque sem noção. O nome dele é Chico, um cachorro de um ano que Ana ganhou dos pais – os agrônomos Ari e Lina - num momento difícil. No começo do ano passado, ela ficou abalada ao saber que, mesmo após um ano inteiro de estudo pesado, não havia sido aprovada no vestibular.
“Eu fiquei sem chão com a certeza de mais um ano duro e sabendo que estudar é um ato muito solitário”, conta. Chico veio de um canil perto da casa dela, especializado na raça bulldog chinês, lhe fez companhia nesse período. Mas à moda dele. O cão não para um minuto, é bagunceiro por definição e expulsou dois dos três gatos que viviam no lugar. “Ele sabe quando eu estou bem e quando estou mal. Se me percebe meio pra baixo, não dá outra. Ele pula em cima de mim e fica me lambendo o rosto até que me vê dando risada”, explica.
Deu certo o ‘apoio sem noção’ do Chico? Claro que deu. No final de janeiro, Ana soube que foi aprovada e irá estudar na Unesp (Universidade Estadual Paulista), no campus de Bauru. No curso de veterinária? Quase. Ela fará biologia e já planeja o futuro. “Penso em trabalhar num zoológico ou numa ONG dessas que salvam as baleias”, conta. Chico ainda não ‘sabe’ que neste ano ficará sem a companhia diária da dona. “Mas vou deixar minha mãe e minha irmã com a missão de cuidar dele”, conclui Ana. (por Ronaldo Victoria)